Frágil e humilhado, num dia, o ser humano, no outro, humilha e fere. É como
o Prudêncio, escravo que o Brás Cubas humilhou e espancou quando eram ambos
crianças e que está, no cap. LXVIII do Machado, espancando um outro escravo
em plena rua. Um escravo que tem escravo; um humilhado que humilha; um
ferido que fere. Um injustiçado injusto. Uma mera questão de posição e
oportunidade: matar ou ser o morto depende, não raro, da posse da arma.
E nós, humanos, assistimos a tudo isso como se não fosse conosco, sem
observar que o monstro e a vítima estão no mesmo corpo, no nosso corpo e dos
iguais a nós. Sem observar que a condição de vítima é fruto de uma eleição
cruel dos que se sentem em condições de manifestar o poder dos monstros. E
que nenhum povo ou pessoa, por mais que tenha sofrido, ganha o direito de
humilhar e fazer sofrer.
Pensamos hoje que o problema não é nosso. E queira Deus que o problema nunca
seja nosso, pois se estivermos sendo agredidos e humilhados, pensarão que o
problema não é deles. O lobo conta sempre com essa vantagem: os cordeiros
não se defendem em bandos, não se solidarizam.